
Uma semana. É verdade, já totalizava mais de uma catrefada, o número de horas que tinha passado nesta prisão domiciliária, quando a J. mete o carro a caminho e me aparece em casa, saída de Vigo. Ora uma pessoa, apesar de estar em pós-operatório , tem de valorizar os gestos de amizade dos outros. E, se ela veio para me tirar de casa eu, apesar de ter feito alergia ao único medicamento capaz de me anular as dores, tenho de lhe fazer a vontade. Pareço um Ferrero Rocher? Pareço. Mas é só nos braços e nas costas, e optei por deixar a parte favorita tapada. E que mais pareço eu? Pois vos digo, nas palavras da J., mal me pousou os olhos em cima:
- Tu estás com icterícia? Vou-te oferecer auto-bronzeador. Porra, só espero que tenhas pó nesta casa...
Não, não tinha pó (maquilhagem, entenda-se) nesta casa. E saí à rua, amarela como um canário e cheia de borbulhas. Auto-confiança a atingir níveis mínimos, coisa nunca antes vista (afinal, eu sou aquela que
flirtou com o "instrumentista" na sala de operações, quando usava apenas uma bata fabulosa e uma touca na cabeça... é preciso ter-se alguma lata. E culpar o stress pré-operatório, sendo preciso). Com o vendaval que estava lá fora, o cabelo também não secou da melhor forma e, quando chegamos à Marina do Freixo (se há palavras que eu acho não fazerem sentido juntas é Marina e Freixo, mas é assim que se chama,
what to do?), pensei em tudo menos em fazer olhinhos aos rapazes da mesa do lado, ou procurar algo de interessante para me aquecer o espírito, para além do sol. Assim sendo, sobrou-nos pouca coisa para fazer, além de reparar no ambiente
sui generis e nas pessoas que o compunham. E demos por nós a reparar numa Barbie que acompanhava um daqueles senhores broncos que se encontram às resmas em locais como aquele. Vou descrevê-la: tinha umas mamas enormes, semi-cobertas por um top lilás. Um pneu a querer espreitar no espaço que mediava os jeans e o top. As mamas, não sei se já disse, eram enormes. Tinha um cinto com uma borboleta gigante apertado dois buracos acima do que era suposto (aposto que essa foi a razão para não se ter sentado um único minuto. Escolher entre o tamanho do cinto e a própria vida não deve ter sido fácil...). Talvez por não respirar, as mamas dela eram enormes. Era loira (tão natural como a água nas praias do Dubai). Os sapatos, esses, faziam um
pendant quase perfeito com o top. Cerca de 19 centímetros de salto agulha e uma incapacidade de se equilibrar neles notória. Ele... ele era um bronco atarracado que ostentava orgulhosamente um troféu. Com aquele ar, e depois de uma observação para avaliar os espécimens em questão, eu dito a minha sentença:
- Euromilionários.
Ficamos um pouco em silêncio. Até olharmos as duas na direcção dos saltos, já estacionados em frente a nós, e repararmos numa etiqueta gigantesca naquela parte do sapato que está entre a sola e o salto, aquela que está na diagonal, e que, neste caso, ditou o final daquela história: € 19,90. Nisto a J. olha para mim a rir, e diz:
- Fod@-se, só se ela meteu o Euromilhões todo nas mamas...