
Nunca fui praticante da política de boa vizinhança. Falo baixo nos corredores, despejo o lixo no sítio certo, ocupo o meu lugar de estacionamento, digo "Bom dia!" e "Boa noite", pouco mais. Nunca fui de achar que tinha de me dar com esta ou aquela pessoa só porque o universo nos pôs a morar numa mesma rua ou num mesmo prédio. Por isso, o que vou contar do meu novo vizinho é porque acho que ele é o meu novo vizinho. Pode morar aqui há meses, ou até há anos. Não sei, nunca o tinha visto antes. Antes do quê? Antes de me cruzar com ele no elevador pela primeira vez. Eu saía da garagem, ele dirigia-se para lá. Fiquei com a nítida sensação que ficou à espera de ver qual o andar que eu marcava. Troquei-lhe as voltas: marquei 0 e fui ver o correio. Mais tarde fiquei com a sensação que talvez aquilo tivesse sido impressão minha. E até achei que estava a ser um pouco convencida. Da segunda vez, uns dias depois, a cena repetiu-se, quase como um
dejá vu. Breve pausa para descrever o vizinho: alto, giro, moreno, olhos muito verdes. Diz "Boa noite!". E fica a ver para que andar vou. Ora na sexta-feira, ainda eu fazia contas de cabeça para ver como me ia safar com a troca de umas lâmpadas fundidas (a primeira de duas da entrada fundiu há mais de duas semanas e eu não liguei. Quem precisa de tanta luz? Um dia convida-se os pais para jantar e deixa-se no ar ao pai que a luz fundiu... mas quando a primeira de duas lâmpadas da casa-de-banho (o sítio onde preciso de me pentear, maquilhar, arranjar) estoura à minha frente, a coisa passou de passível de protelação para urgente, num ápice) quando o jovem decide repetir a cena. Ora já era tarde, eu precisava de luz, e tenho muita lata. Quando entrei no elevador e ele ficou ali especado, eu lá respirei fundo e perguntei:
- Posso perguntar porque é que fica sempre parado quando eu entro no elevador?
- Eu? Fico? Por nada...
Fod@-se, um xoninhas.... era mesmo disso que eu precisava.
- É que fico com a sensação que quer ver para que andar eu vou.
- Não. Se o faço, é sem dar conta...
Rubor...
- Que pena. É que eu tenho estas lâmpadas para trocar (meto a mão no saco do supermercado para lhe mostrar a prova) e nem imagino como fazê-lo. Se quisesse, não ficava só a saber o andar, como ficava a saber qual a casa. E ainda lhe oferecia um café. Assim sendo, tenho que me desenvencilhar sozinha. Boa noite.
Enquanto a porta do elevador se fechava, eu juro que o ouvi suspirar um "Boa Noite!" já atrasado. A cara dele não teve descrição. E, melhor que tudo, descobri que trocar uma lâmpada (sozinha) é simples, mesmo para quem não tem jeito nenhum para a bricolage.