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Se vocês trabalham numa empresa que produza bens ou que preste serviços, é possível que tenham de conviver directa ou indirectamente com gente que compre o fruto do vosso trabalho. Feita que está a introdução, sou a informar que as pessoas que compram (todas, a certo ponto da vida – isto inclui eu própria) me metem nojo (isto não será para todos, certamente não será para mim). As pessoas, genericamente, perderam a vergonha, o discernimento e a noção. As pessoas querem um “precinho”. Não importa a razão, as pessoas querem “o melhor preço”, já não aceitam pagar algo sem um desconto. Porque é a primeira vez. Ou porque já não é a primeira vez. Ou porque é a coisa da crise. O país transformou-se numa Marraquexe imensa, onde as pessoas acham que estão a ser levadas por lorpas. Que as empresas se lambuzam com margens brutais. As pessoas perderam o respeito pelo trabalho dos outros. A crise deixou-os com o barómetro da decência avariado. As pessoas não querem abdicar de coisas. Querem que as empresas lhes permitam pagar menos pelos mesmos produtos ou serviços. Se eu olho para uma coisa e acho que ela não vale aquilo? Olho. Se eu penso que irei esperar pelos saldos para comprar esta ou aquela coisa? Penso. E espero. Mas que me caia já aqui um raio em cima se sou uma pessoa capaz de ir para um restaurante pedir para me oferecerem a entrada, dado é a minha primeira vez ali (já vi), de ir para sites de produtos cosméticos alertar para o facto de que me devem mandar amostras pois eu só comprarei depois de experimentar (também já vi) ou de ir para o balcão de um hotel dizer que viram um preço não sei onde e que, por estarem ali, acham que merecem um desconto (não é que também já vi?). Há toda uma nova cultura de regateio que eu abomino. Pode ser feitio. Pode ser defeito, mas não só não sou cúmplice como abomino a atitude desrespeitosa com que as pessoas decidem tratar a vida e o trabalho dos outros. O desconto tornou-se uma (estranha) forma de vida. As pessoas não sabem viver sem ele. De tal forma que estão dispostas a ser chico-espertas, desavergonhadas e até mal-educadas. As pessoas dedicam-se à pedinchice porque acham que é um direito que lhes assiste. Reivindicam preços mais baixos “porque isto está mau”. Querem pagar menos “porque a crise está aí e os vendedores devem querer ficar com os stocks, com aqueles preços”. Já tínhamos um país com parasitas, que vivem de coisas que o trabalho não lhes traz. Também já havia muitos “mascarados”, a viver além das suas possibilidades, vítimas de um estatuto a que aspiram. Agora a eles juntam-se os pedinchões, os “cravas”, os que acham que o dinheiro de hoje, apesar de menos, terá de servir para pagar as mesmas coisas, e que cabe aos outros resolver-lhes este problema. Estou farta. Farta de dizer “não!” ao descontinho da treta. Farta, farta, farta. A maior crise que este país atravessa, já o disse enésimas vezes, é a de valores. E de decência, permito-me acrescentar.
Ao contrário da maior parte das pessoas, não vou pôr-me com falsas modéstias: sou gira, sou inteligente, sou interessante. Mas também sou Má... como todas as mulheres, não é? Como perceberão com as leituras, e como este é um reflexo de mim, naturalmente tenho um blog bipolar!